sexta-feira, 28 de agosto de 2015

QUEDA DO MURO DE BERLIM: EU VI

Talvez você pense que as palavras que seguem abaixo não tenham relação com a temática deste blog. Mas para e observa... Será que temas como quebra de paradigmas, período de transição, transformação de comportamento social, lideranças políticas e modificação da legislação não faz parte, também, do pouco que vivemos hoje?

Deixo vocês com esse testemunho incrível... e pergunto: O que significa presenciar todas essas transformações?

Boa leitura.

Abraço,

Paloma Mendes

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QUEDA  DO MURO  DE  BERLIM: EU VI

Nilzardo Carneiro Leão

1989. 26 anos passados, estávamos, o Dr. João Benedito de Azevedo Marques,  Presidente do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), e eu, então Conselheiro do mesmo órgão, na República Federal da Alemanha, em Bonn, sua Capital, convidados que fôramos  pelo Ministério da Justiça daquele país, para participar de uma série de debates sobre o Código de Processo Penal alemão,  que o governo  pretendia modificar.
Além das reuniões de trabalho no próprio prédio do Ministério da Justiça, fomos levados a outras cidades para conhecer o funcionamento do sistema processual penal, bem como outras instituições. Fomos a Berlim conhecer o Centro de Dados, sistema de informação e banco de informações, salas imensas, poucos funcionários, de lá saiam, todos os dias, para todo o pais, mais de 4.800  respostas e certidões.
Hospedados estávamos no Hotel Intercontinental. Certo dia, vimos pelas ruas pessoas correndo, aos gritos, algumas conduzindo marretas, martelos, pedaços de ferro. Tudo estranho em uma cidade onde a ordem estava presente em tudo e com enorme padrão de organização.E veio a informação: ESTÃO DERRUBANDO O MURO!.
Na véspera, estivera eu com João Benedito junto àquela muralha. Confesso  ter sentIdo uma emoção diferente ao ver aquele MURO cortando a cidade, soldados portando metralhadoras e caminhando pelo mesmo, no alto, a impedir qualquer tentativa de possíveis  fugas para a RFA.
Do lado em que nos encontrávamos, naquela ocasião, constatamos,  próximo à sua base, cruzes cravadas no chão, a mostrar local onde alemães foram sumariamente metralhados e mortos por soldados, de cima do MURO, quando em dramática tentativa de fuga.
Não era como a “Muralha da China”, construída muitos séculos passados, milenar, para proteção contra ataques de tribos ou de povos vizinhos. Não. Era uma barreira de concreto de vários metros de altura e alguns de largura, construído em pleno século XX, para barrar ideias, como se fosse possível com concreto e tijolo impedir no homem o desejo de liberdade. Ainda que para isso se tivesse de dividir uma cidade, grande centro de conhecimentos e de cultura, afastar parentes, cortar raízes  culturais. Custa a crer o que foi feito: Berlim cortada pela metade, com lugares que, de um lado, parte da rua pertencia à RDA, a outra à RFA!
No Brasil, longe, ouvia falar do MURO, lia, via filmes mas, o que representava, só junto a ele foi possível entender o que realmente significava. Fiquei a imaginar e  a sentir as mesmas dores e sofrimentos dos que ficavam de cada lado..Olhava e lá estava ele, gigante de cimento, símbolo do autoritarismo e do poder de mando.
Do lado onde estava, RFA, era ele pintado e desenhado com protestos e apelos de paz e liberdade; do outro lado, limpo, tristemente pintado de amarelo-cinza, soldados a montar guarda. Cheguei a escrever naqueles dias, para nada esquecer: em verdade, não foi só a ruptura de um MURO, revelava  início de mudança de toda uma estrutura de sustentação  política, rompida de tal forma que nos dias que se seguiram imprevisíveis as consequências. Os fatos passavam a acontecer, naqueles instantes, com uma rapidez tão grande, que nem os próprios alemães,  podiam prever o que iria acontecer dentro de semanas, de dias.
Também participei da derrubada, trago guardado comigo, pequeno pedaço do MURO  e a foto, eu, com um martelo, também dando minha contribuição à liberdade. Emocionante ver milhares de alemães, homens e mulheres com picaretas, martelos, marretas, qualquer instrumento, destruindo e derrubando o  que dividia a cidade., alguns gritavam, como se com seu ato fosse uma forma de busca de libertação para os irmãos., outros, revelando nas faces a raiva, terceiros a rirem e se abraçarem.  Tudo indescritível na sua grandiosidade.
Cada dia, maior o número de alemães que passavam pelas aberturas feitas no MURO para o lado ocidental, facilmente identificáveis: roupas grosseiras, barbas por fazer, grossos sapatos, casacos “surrados”, as mulheres mal vestidas, unhas sem trato, cabelos aparentando mal penteados.
A queda do MURO criou problemas. Era dado a cada um deles, pelo Governo da RFA cem marcos  para passarem o dia e muitos guardavam parte do recebido para levar de volta para casa. O ROTARY também passou a fornecer uma refeição pela manhã. E eram longas as filas de espera.
Muito o que contar. Cada dia que passa, uma pequena lembrança do que vi  vem sendo trazida ficado gravado. os fatos, as emoções de cada instante, naqueles instantes momentos de grandes interrogações e perspectivas para o futuro.
A QUEDA DO MURO, EU VI.

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